domingo, 13 de maio de 2012

A culpa é da educação – ou da falta dela

Entre 1996 e 2010 foram registradas mais de meio milhão de mortes nos diversos tipos de acidentes de trânsito 

 Pode parecer um pouco forte ou até mesmo piegas colocar a culpa de todos nossos problemas na educação. Afinal, hoje em dia ela é apontada como epicentro de todas nossas desavenças sociais, seja por mortes no trânsito, assassinatos dolosos, ou um entrave durante um jogo de futebol que toma proporções absurdas. No entanto, a educação vira centro de debate toda vez que um assunto não é bem resolvido no País, como é o caso do nosso caótico trânsito. Grandes veículos da imprensa brasileira abordaram o tema trânsito, e principalmente as mortes de motociclistas que nele acontecem, na semana passada, embasados por números do Denatran, um estudo do Instituto Sangari e dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Muitos de vocês devem ter lido a repercussão destes números. E em cada texto notava-se a frieza dos dados (mortes), a justificava focada no crescimento da frota de motocicletas e nenhuma solução. Devo admitir que não sou o Messias que trará um desfecho para essa trágica história. Mas podemos olhar essa problemática social com outros olhos.

O respeito e a prudência são os aliados dos motociclistas na busca por um lugar seguro no trânsito 

 Sabiam que o número de homicídios dolosos (quando há intenção de matar) cresceu 79,25% em São Paulo, na comparação entre março deste ano e o mesmo mês de 2011 segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado? Ou que o maior estado nordestino, a Bahia, é também o que mais registrou assaltos a banco em 2012: ao todo foram 14 ocorrências até fevereiro, 77% a mais que em 2011, segundo dados do Sindicato dos Bancários do Estado? Ou até que os conflitos em áreas rurais do Brasil aumentaram 15% em 2011, primeiro ano de gestão da presidente Dilma Rousseff, na comparação com 2010? Os dados foram divulgados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), segundo os quais houve 835 conflitos fundiários em 2010 e no ano passado esse número saltou para 1.035 – um crescimento de 24%. Se sabiam ou não, pouco importa. O relevante é que o Brasil todo passa por um processo de enfrentamento social. Intolerância gera violência, que por sua vez pauta as atitudes imediatistas dos nossos comandantes (políticos). Por isso não adianta dizer que os motociclistas foram a única categoria que registrou alta no número de mortes entre 2005 e 2011 — saltando de 23% para 38%, enquanto pedestres, ciclistas e motoristas decresceram. O que realmente vale a pena é absorver estes fatídicos números e reconhecer nossa parcela de culpa. Seja em uma derrapada na garagem de casa ou num cruzamento em que não se respeitou a preferência, sempre há uma desculpa. Nós nunca caímos sozinhos, não é mesmo?

Na última década, mortes envolvendo motociclistas cresceram 244% Foto: Joel Silva/Folhapress 

 Por outro lado, podemos afirmar que, somados, automóveis e ônibus fizeram 341 vítimas por atropelamento em 2011, sendo o número total de vítimas de 1.365. É tudo uma questão de óptica. Mudando um pouco de assunto e trazendo uma boa notícia, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) destacou que a mortalidade infantil no Brasil reduziu praticamente pela metade (47%) na última década. Os dados divulgados estavam dentro das expectativas do Ministério da Saúde e revelam que o Brasil já alcançou os índices de redução definidos pelas metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, acordo internacional. Porque esse assunto? Pois lembremos que a Organização das Nações Unidas (ONU) proclamou uma Década – 2011-2020 – de Ação pela Segurança Viária em sua Assembléia Geral, realizada em março de 2010. Ou seja, podemos combater esses números frios com ações quentes, a fim de realmente fazer algo para mudar a segurança no trânsito brasileiro. Acredito não haver só um culpado e também não vejo a motocicleta como o maior vilão. Só acho que o povo brasileiro é muito carente de educação. Enquanto atitudes como o primeiro CEPAM – Centro Educacional Paulistano de Motociclistas – não saírem do papel e virarem realidade, continuaremos com saudade de algo que muitos nunca tiveram: a educação.

Se as moto-faixas não ajudaram, novas atitudes precisam ser pensadas por nossas autoridades 

 Não adianta nada ser a sexta economia do mundo, se nossos problemas estruturais não são combatidos em tempos de calmaria econômica. Por isso vale dizer que as taxas de mortalidade infantil, por exemplo, não só iluminam sobre a quantidade de crianças que estão morrendo. Indicam, também e fundamentalmente, a existência (ou a ausência) de infraestrutura de atendimento infantil, vulnerabilidade a epidemias ou doenças, aleitamento materno, condições de higiene, mecanismos culturais, políticos e sociais de tratamento das crianças, entre outros fatores. Também as taxas de mortalidade no trânsito nos indicam algo além do número de mortes. Apontam os modos de sociabilidade nas vias públicas, a eficiência dos mecanismos de gestão do trânsito, os níveis de segurança dos veículos, das ruas, os mecanismos de fiscalização, as respostas aos acidentados e assim por diante. Até combatermos todos esses problemas, o norte de todas as discussões deverá ser a educação. Somente através dela o Brasil e o trânsito brasileiro têm futuro — e quem sabe até com a motocicleta como solução e não como o maior problema.

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